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“Turismo é mais que fazer eventos”, argumenta secretário de Turismo de Itanhandu
Publicado dia 22 de Maio de 2022 às 15:23 por Luís Cláudio de Carvalho
Modificado dia 22 de Maio de 2022 às 15:31 Luis Gustavo Franco da Rosa, conhecido como Tatau, secretário de Turismo e Cultura de Itanhandu, conversou com o Serra das Águas sobre a importância de preservar a história e de regionalizar o turismo nas Terras Altas da MantiqueiraAtuando com turismo e cultura desde 2005, Luis Gustavo Franco da Rosa, o Tatau, acredita que as cidades da região das Terras Altas da Mantiqueira têm potencial para ir muito além na exploração do turismo para movimentar a economia. Atualmente, ele é secretário de Turismo e Cultura de Itanhandu e trabalha de forma a valorizar a história da cidade, mostrando tanto para a população, como para o poder público, que é possível atrair turistas para a região de forma sustentável.
A cidade, que completa 100 anos em 7 de setembro de 2023, tem muitas histórias para contar. Desde o nome, que foi escolhido por conta do Rio Itanhandu e que tem ligação com a linguagem indígena e elementos naturais encontrados lá – “ita” significa pedra, e “nhandu” significa seriema ou aranha -, Itanhandu tem atrativos naturais e culturais que, para o secretário, podem ser melhor aproveitados se houver fomento do poder público e apoio da população.
Alguns exemplos são os casarios datados de 1920 no Centro da cidade e os túneis da antiga fábrica da Vigor. “Itanhandu era uma cidade muita vanguardista. Aqui aconteceram muitas coisas, e esse nascimento da Vigor em Itanhandu é muito legal, pois é uma fábrica tão importante até hoje, e que nasceu aqui. Há alguns túneis que ainda conseguiram ser preservados, apesar de o prédio ter ficado em ruínas alguns anos, mas os proprietários atuais não fecharam os túneis. Eles nos chamaram para ir lá conhecer e é muito legal, porque você passa a mão na parede e sente o sal, e vê a água correndo pelos túneis. O pessoal fala muito hoje no terroir, e são exatamente as bactérias que viviam naqueles túneis que davam o sabor ao queijo produzido ali. Eu não sabia disso, para nós foi uma gostosa surpresa. Do outro lado, onde era a Companhia Batista Scarpa, fomos conhecer outro lugar onde se fazia a maturação do queijo”, conta Tatau.
Os casarões, construídos pouco antes da fundação de Itanhandu, que pertencia a Pouso Alto antes de ser emancipada, de acordo com ele, também contam parte da história da cidade, e devem ser preservados. “Muitos deles, infelizmente, foram demolidos, mas estamos buscando preservar os que sobraram. Três famílias já solicitaram tombamentos do patrimônio, é o caso do casarão da família Sampaio, da casa do professor Brito, e aquele na esquina do Calçadão com a Fernando Costa, que tem uma relevância muito forte. Também tem um casario da família Braz Scarpa, onde viveu a filha do Wenceslau Braz, e ele vai ser tombado esse ano”.
*Viaduto e árvore dos enforcados*
Tatau também fala sobre a passarela que liga a Avenida Fernando Costa à Rua João Batista Scarpa por cima da linha férrea, que tem em sua história elementos políticos, mas também de romance, e muitos itanhanduenses não sabem disso. “A história da passarela eu ouvi do próprio João Batista Scarpa. Ela é chamada de viaduto pelos itanhanduenses, ninguém chama de passarela. Foi construída, na época, por uma questão política. Já existia uma passagem de nível, mas o Coronel Batista Scarpa constrói a passarela, que só era usada por quem o apoiava politicamente, então ela tem uma conotação bacana da história política de Itanhandu, que também é muito forte. E tem uma história de romance também, que une esses dois políticos que eram rivais. Os filhos deles se apaixonam e acabam trazendo uma certa união para eles também. A passarela faz a união dos dois pontos, e no nosso olhar cultural e romantizado, ela une o amor da Dona Laís com o Dr. Ciro, que eram filhos dos dois coronéis, e a casa deles, por coincidência, é em frente a essa passarela”.
Mas as histórias de Itanhandu não têm nuances apenas de romance ou política... Uma delas tem uma conotação de terror. É o caso da “árvore dos enforcados”, que ficava no Bairro Bom Sucesso, antes de cair em 2009 – por coincidência, em uma sexta-feira 13. “Em 1932, depois de invadirem Passa Quatro durante a Revolução Constitucionalista, os paulistas vieram tentar invadir Itanhandu também e capturar o prefeito da época, que era a favor de Getúlio Vargas. E ele morava no Bom Sucesso. Fiz um trabalho com crianças para explicar por que a árvore era chamada de árvore dos enforcados, e todos tinham uma curiosidade muito grande. Muita gente contava que ali apareciam assombrações, se escutava barulhos de corrente... Mas com o trabalho de pesquisa, descobrimos que realmente morreu uma pessoa embaixo dessa árvore durante essa ocasião da revolução, teve derramamento de sangue, e aí todo mundo que passava ali começava a contar a história de um jeito diferente. Como não houve registro escrito, essa história foi se perdendo e sendo modificada. Daí a importância de se registrar a história, para ela não ir se perdendo”, explica.
Por isso, o secretário defende que esses locais, que tiveram conotações políticas e culturais para cidade, sejam utilizados para o turismo, mas de uma forma que também sejam preservados. “São histórias com as quais a gente vai se deparando através da história oral. O nosso papel, enquanto trabalhadores do turismo e cultura, é ir a esses locais, pedir licença aos proprietários, que nos recebem muito bem e contam um pouco do que eles sabem. As pessoas tinham esse lado empreendedor no passado, e o itanhanduense tem que ter orgulho dessa história. Temos que olhar para esse passado, ver o que eles faziam, e tentar trazer isso para as pessoas de agora. Eles fizeram muita coisa, e deixaram uma história muito bonita para nós”.
*Turismo regionalizado*
Além da experiência que adquiriu como secretário de Turismo de Itanhandu em diversas gestões, Tatau atuou também em Passa Quatro, onde, de acordo com ele, recentemente, houve uma mudança com relação ao modo como o turismo é gerido. Tomando como base este exemplo, e também de outras cidades que estão se consolidando na indústria do turismo no Brasil, como Pirenóplis (GO), e até cidades mas próximas, como Alagoa e Itamonte, Tatau diz acreditar que a região das Terras Altas da Mantiqueira tem potencial para diversos tipos de turismo.
“Temos uma região do Jardim que é riquíssima, fica até um pouco acima do bairro, a cerca de 1.400 metros de altitude, onde tem o Ivos Camping e Hostel, que está sendo um divisor de águas daquela região. É um local onde o Rio Verde ainda é muito puro, e com a vinda desse hostel e camping lá em cima vai dar uma visibilidade muito grande para Itanhandu. Muita gente acha que nem temos áreas naturais bonitas, mas muito pelo contrário, apesar de ser um município pequeno, as nossas áreas rurais mostram exatamente isso. Temos locais para fazer contemplação da natureza, temos locais para turismo rural de base comunitária, principalmente nas regiões da Serra dos Noronha e do Bom Sucesso. Lá tem plantio de uva, de oliveira, então temos produtos artesanais nessa região que podem ser explorados”.
Ele cita também as trilhas, que, apesar de serem muito realizadas em Passa Quatro, também acabam movimentando a economia de Itanhandu. “Em Passa Quatro é muito natural o turismo das trilhas, porque o pessoal vai para a Serra Fina. Mas quando voltei para Itanhandu, acabei percebendo, conversando com o pessoal do setor de hospedagem, que muitos turistas se hospedam em Itanhandu já buscando a Serra Fina por aqui também. As pessoas vêm fazer as trilhas para andar de bicicleta, e isso tem se fortalecido ano a ano. É um exemplo de como seria bom ter um calendário de eventos esportivos, porque não fortaleceria só Itanhandu, mas a região toda, porque quem vem, pega a bicicleta e vai para Capivari, São Sebastião, Virgínia, Itamonte, Passa Quatro... Nossa região é muito linda. Até hoje eu sinto muito de não termos despertado para o turismo. Temos um turismo de negócios que é fortíssimo, por exemplo, e muitas pessoas não veem isso como turismo. Mas é o que movimenta a nossa rede hoteleira e o nosso setor de alimentos e bebidas de segunda a quinta. Itanhandu tem muita gente circulando, e o povo da cidade, por estar muito enraizado nas empresas daqui, não percebe essa movimentação. Acham que turismo é só fazer festa, mas não é isso, não é só fazer os eventos”.
Por isso, ele defende que haja uma mudança de pensamento, tanto por parte da população, como do poder público, de maneira que o turismo regionalizado seja uma aposta das prefeituras, que precisam investir e tornar isso realidade. “Temos algumas cidades que são âncoras. Elas são fortes e podem puxar público para as demais. Sabemos do potencial da região, mas também sabemos que tem cidades que estão um pouco à frente, que é o caso de Aiuruoca, Passa Quatro, Itamonte, Alagoa, com o queijo, que acabou fazendo com que a região se movimentasse. Então a gente vê o quanto é importante ter cidades fortes e consolidadas na área. Se a gente não tivesse essas cidades, muitas vezes, as pessoas talvez não tivessem nem ouvido falar da região. Tenho conversado com alguns secretários para tentar fazer movimentos regionais. Estamos alinhando a primeira Semana do Patrimônio Cultural Regional, e a nossa ideia é fazer com que isso se estenda para a região. Vamos começar pequeno, com as cidades mais próximas, e ano que vem a gente pensa em aumentar um pouco mais. Porque se a gente fizer esse movimento, acho que as pessoas vão começar a perceber que tem que perder um pouco esse bairrismo e se unir. Temos músicos bons, temos comidas boas, temos boas histórias, e quem viajar para locais como os da nossa região quer conhecer a gente. Então se temos produtos locais, vamos ocupar esse espaço! O que não falta na nossa região é coisa boa, e disso podemos ter certeza”.
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Luís Cláudio de CarvalhoLuís Cláudio de Carvalho é fundador do site Serra das Águas e bacharel em Administração Pública. Tem experiência como Coordenador de Turismo e Cultura, Secretário de Governo e Ouvidor Municipal
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